Se o pedido de interdição do presidente Jair Messias Bolsonaro partisse das agremiações partidárias oposicionistas, não teria muita repercussão. A opinião que tomaria corpo era a de mais um ato de “politicagem” dos adversários. Afinal, estão todos com os olhos direcionados para a sucessão do Palácio do Planalto: fulanos, sicranos e beltranos.
Mas não é o caso. Quem está alegando a incapacidade da maior autoridade do Poder Executivo é um grupo de juristas de renome, respeitadíssimo, que acaba de acionar o STF para obter a declaração de incapacidade do presidente Bolsonaro e, como consequência, o seu afastamento da Presidência da República.
Assinaram a petição os professores Pedro Dallari, da USP, Roberto Romano, da UNICAMP, Renato Janine Ribeiro, da USP, José Geraldo de Sousa Jr, da UNB, e os conceituados advogados Fábio Gaspar, Alberto Toron e Alfredo Attié, presidente da Academia Paulista de Direito.
Na ação que pede ao STF que Bolsonaro seja declarado incapaz, os signatários ressaltam que não estão imputando ao mandatário-mor do país crimes de responsabilidade ou comum. “Não o acusamos de crimes, sequer o acusamos. Estamos observando apenas que ele não pode exercer, e de fato não está exercendo devidamente, o cargo no qual foi empossado”, sublinham os autores do pedido.
Em relação ao ponto da pandemia, a peça jurídica diz “que é visível que Bolsonaro deixa de tomar medidas para minimizar os efeitos da doença, proteger cidadãos e cidadãs, agravando os riscos de contágio, doença e morte, que o presidente insiste em propagar notícias falsas, em defender e determinar a adoção de tratamentos falsos”.
Os autores da ação pedem também uma perícia. “É evidente que, sem exame pericial por profissionais reconhecidamente competentes, não se pode decidir a interdição de pessoa considerada insana, que cabe a Colenda Corte Suprema decidir e determinar a realização de exame pericial, a cargo de professores de psiquiatria e outras áreas da ciência psíquica, com currículo reconhecido e respeitado, para verificar de que modo e em que extensão se apresenta essa insanidade daquele que ocupa o cargo de Presidente da República”.
Finaliza dizendo que “constatada a insanidade, o STF decidirá qual “remédio jurídico” poderá ser adotado para corrigir os prejuízos para a sociedade, sem que se olvide da necessidade de afastamento, quiça imediato”.
Pois é. Até que ponto chegamos. Pedido de interdição do presidente da República. Lembrei agora do saudoso sociólogo Selem Rachid Asmar, que, ao ser questionado sobre a Região Cacaueira, dizia “Pobre Região Rica”. Pobre no sentido do espírito coletivo de suas lideranças políticas e rica no potencial econômico.
Pobre Brasil rico, é o Brasil de hoje. Ainda bem que é abençoado por Deus, pela natureza e por alguns políticos que honram seu mandato. Infelizmente, pouquíssimos. A regra é o enriquecimento pelos cofres públicos, a descaracão, o cinismo e a roubalheira.
Um país que tem uma significativa parcela do eleitorado adepta do “rouba, mas faz”, está fadado a um futuro desesperançoso, sem perspectiva de justiça social, o que afronta o princípio constitucional da dignidade do ser humano, que é imprescindível para a consolidação do Estado democrático de direito.
Marco Wense é Analista Político