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Se depois do advento e popularização do smartfone os políticos continuam fazendo promessas das mais absurdas, imagine no tempo em que um simples gravador de áudio era uma das peças mais difíceis, por ser um trambolho grande, pesado e sem tecnologia. Nesse tempo, então, se prometia um rio de leite e uma barranca de cuscuz em troca de um simples voto, ao primeiro eleitor que encontrasse.

E essa prática ocorria em todo o Brasil brasileiro, de norte ao sul e do leste a oeste, sem distinção de cor ou ideologia partidária. Para ser mais coerente com o que digo, faziam parte dos discursos em praça pública, em cima dos palanques dos famosos comícios realizados pelas coligações, com a simples finalidade de mostrar intimidade com prefeitos, governadores, e até o presidente da República.

Além dessa prática poderosa, outros políticos, principalmente os da chamada ideologia de esquerda e/ou populista, utilizavam, ainda, outro artifício, principalmente com grupos e classes. Geralmente vendiam a aparente igualdade, apelando para o discurso que teria vindo de baixo, daí a importância de que votassem nele, por ser exímio conhecedor dos problemas sofridos pela grande massa dos trabalhadores.

De início, o apelo era considerado fraco e somente uma meia dúzia se beneficiava dessa situação, já que o apelo ideológico não conseguia encher a barriga de ninguém, muito menos satisfazer outras necessidades básicas da família. Bom mesmo era o político que dava uma ajuda substancial, com um bom corte de brim, um sapato Vulcabras, um dinheiro para completar as despesas da feira.

Mas com o tempo, os eleitores também foram mudando de hábitos e passaram a se encantar com os discursos feitos sob medida para cada área da cidade e classe social pelos políticos de esquerda. Se não podiam barganhar o voto com as benesses financeiras pessoais, pregavam a igualdade e a disponibilidade de quem também sofreu como ele [o eleitor], e que estaria 24 horas por dia disponível no seu gabinete para recebê-lo.

📷 Foto de José Nazal

Um desses casos era lembrado por Raymundo Pacheco Sá Barreto, um exímio contador de histórias e estórias, além de ser aquele amigo que todo o mundo gosta. Profundo conhecedor de Ilhéus, sua política e história, foi nominado por Jorge Amado como o “último coronel do cacau”. Também afeito à lides política, Sá Barreto costumava contar essa hi(e)stória de um então candidato a prefeito de Ilhéus.

No último quartel do século passado, início de campanha à Prefeitura de Ilhéus, em que um dos candidatos caiu em campo na busca de votos pelo então Partido Democrático Brasileiro (PMDB). Para cada área da cidade ou grupo de pessoas tinha um discurso pronto e se apresentava como a solução para todos os problemas de Ilhéus, inclusive aqueles que o prefeito Antônio Olímpio não tinha conseguido resolver.

Nessa empreitada contava com Sá Barreto, conhecedor e bem chegado em todas as “bibocas” e seus ocupantes de Ilhéus. Lá, o candidato a prefeito abria o vozeirão para prometer Ilhéus como o melhor lugar do mundo para se morar, desde que lhe elegessem, é claro. E a campanha crescia a olhos vistos, tanto que o candidato aparecia na liderança em todas as pesquisas eleitorais.

E muita sola de sapato e discurso para todos os gostos eram feitos dia e noite, sempre prometendo a Ilhéus dos sonhos, que somente ele conseguiria transformar, desde que lhe colocassem no Palácio Paranaguá. Era um tal de subir e descer morros, reuniões com associações, almoços nas casas dos coligados, terreiros de candomblé, igrejas e escolas, na sede e nos distritos e povoados.

Num determinado dia, o candidato falava para as professoras, exaltando as qualidades da categoria e dizendo ser testemunha disso, por ter sido sua mãe professora. Noutro dia, um discurso igualzinho foi feito para as lavadeiras, sempre com a mesma defesa, o que preocupou o velho e experiente Sá Barreto, que pretendia levar seu candidato em alguns locais, esses não tão bem-afamados.

Para evitar esse dissabor, Sá Barreto chama se candidato no dia seguinte e faz um alerta:
– Meu amigo, pare com esse tipo de discurso, pois amanhã nós vamos fazer campanha nas casas de umas “conhecidas minhas” e não fica bem você expor a pobrezinha de sua mãe num lugar daqueles – disse, com a autoridade de sempre.

Sá Barreto, que sempre jurou que essa história é verdadeira, também não costumava contar qual o teor do discurso que teria sido feito no local aprazado, embora a retórica tenha funcionado e seu candidato eleito. 


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

*A análise do colunista não reflete, necessariamente, a opinião de Pauta.blog.br

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Em 1964 Itabuna era uma cidade de destaque estadual e até nacional, por conta da economia cacaueira e sua história, muitas delas contadas nos romances de escritor itabunense Jorge Amado, que ganharam o mundo. E nesse imaginário somavam-se as histórias e estórias dos coronéis do cacau e mil e um personagens, desde os trabalhadores rurais, os bichos da Mata Atlântica e as almas penadas que corriam a região.

As estórias contadas pelo povo corriam a cidade que nem rastilho de pólvora após acesso e incendiava de informação toda uma população, não ficando ninguém sem saber dos fatos contados, num boca a boca de fazer inveja às redes sociais da atualidade. Um desses ocorridos mudou o comportamento dos itabunenses, que passaram a dormir cedo, tudo por causa do medo de encontrar noite afora a Mulher de Sete Metros.

À época, pouquíssimos felizardos dispunham de um aparelho de TV na sala de estar, que ficavam praticamente desligados por falta de sinal para retransmitir os programas das redes Tupi, Record, Eldorado, TV Rio. O forte mesmo era o rádio, que nos fornecia diariamente música, esporte e notícia pelas potentes ondas curtas das emissoras de Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro.

Itabuna também não ficava atrás e já dispunha de três emissoras de rádio: a Rádio Clube de Itabuna (1956), Rádio Difusora Sul da Bahia (1960) e Rádio Jornal de Itabuna (1963). E as três rádios disputavam fortemente a audiência regional, realizando transmissões externas em praças, com a apresentação de artistas locais e do sudeste do país, programas de auditório, esportes, policiais com humor e os caipiras.

Um desses apresentadores era Pedro Lemos, imbatível na audiência do horário da 5 às 7 horas, com um programa recheado de recados para as fazendas, os bairros, música caipira (raiz) e estórias dos “tempos do ronca” que ele jurava serem verdadeiras. Seu prestígio na comunidade itabunense daquela época era tanto que foi eleito um dos vereadores mais votados da história política do município.

Homem de hábitos simples, lá pelas quatro e pouca da manhã Pedro Lemos saia de casa e a poucos metros se encontrava com o sonoplasta Carlos Lima e se dirigiam à Rádio Clube de Itabuna, localizada na avenida do Cinquentenário, no segundo andar do prédio nº 424. Com a rádio no ar, Pedro Lemos, baixinho e gordinho, se transformava em um gigante da comunicação radiofônica itabunense. Não tinha pra ninguém.

Entre uma música, um recado, uma pilhéria com um amigo, Pedro Lemos contava uma história, desde a simples trivialidade que tinha visto no dia de ontem às estórias de meter medo a qualquer cidadão temente a Deus e às assombrações. E a da Mulher de Sete Metros, que rondava Itabuna de norte a sul e leste a oeste aterrorizava a qualquer vivente. Parecia até aquelas novelas da Rádio Nacional do Rio de Janeiro.

Pois bem, a cada madrugada era um relato diferente, ora a assombração teria aparecido lá pras bandas dos Canecos, ora no bairro São Caetano, escorraçando quem se aventurava a andar pela madrugada adentro. Pelo que contava, a Mulher de Sete metros se apresentava vestida com um camisolão branco e se postava no meio da rua ou da estrada, apavorando quem resolvesse atravessar em sua frente.

Em Ferradas a situação foi constrangedora, pois um vaqueiro que prometia enfrentar e desmoralizar a mulher de sete metros teve que ser internado num hospício após encontrá-la no meio da rodovia. Dessa data em diante ele perdeu o juízo e a mula que montava saiu em disparada e somente foi encontrada depois de mais de 40 quilômetros, depois de Ibicaraí.
Pelo que contavam os que resolveram se arriscar, a Mulher de Sete Metros carregava uma mala de couro enorme, tinha uma cruz pendurada no pescoço e uma dentadura de meter medo a qualquer vivente. De longe, com uma voz gutural, perguntava qual o rumo a tomar para chegar ao cemitério. Daí em diante, ninguém ouvia mais nada, por ficar paralisado ou sair disparado na carreira.

A cada nova notícia da Mulher de Sete Metros Itabuna caia em polvorosa e a assombração se transformou no assunto da cidade. Ruim mesmo ficou a situação dos que precisavam sair de casa de madrugada para trabalhar, como os carroceiros, padeiros, feirantes, açougueiros e até os soldados do Tiro de Guerra. Enquanto uns incrédulos diziam que tudo não passava de crendices, o assunto chegou ao delegado e ao chefe de polícia, cobrados para que prendessem a assombração.

Uns seis meses depois de aterrorizar mais da metade da população de Itabuna, reunidos no Bar de Biribinha, na cabeceira da ponte do bairro da Conceição, Pedro Lemos foi questionado enquanto tomava umas cervejas com seu amigo inseparável Valdomiro Sapinho, acerca da veracidade das estórias. Sem pestanejar, Pedro disse conhecer todos os que viram a Mulher de Sete Metros e só não dava conhecimento dos nomes para não desmoralizar os coitados.

No meio do disse me disse, Pedro Lemos passou a acalmar as pessoas, dizendo que não mais precisariam se preocupar com a Mulher de Sete Metros, pois ele soube por uma pessoa de sua confiança que ela teria sido escorraçada de Itabuna. Pelo que contaram a ele e ao amigo Valdomiro Sapinho, o autor de tal façanha teria sido um tropeiro que saiu de casa numa sexta-feira noite de lua cheia e teria se transformado num lobisomem.

Com todos mais tranquilos, Pedro Lemos e Valdomiro Sapinho pediram mais uma cerveja. 


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

*A análise do colunista não reflete, necessariamente, a opinião de Pauta.blog.br

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O ano de 2006 foi histórico para a política de Ilhéus. Jabes Ribeiro termina o seu governo de forma melancólica, com inúmeras dívidas sem pagar e sua rejeição beirando os 90%. Com isso, o seu inimigo político número um, Valderico Reis, cresce nas pesquisas de opinião de voto em níveis assustadores. Inicialmente, a sensação era de que tudo mudaria na política ilheense.

Não raro se dizia e até hoje há quem afirme que Valderico Reis foi o candidato escolhido por Jabes Ribeiro para ser o seu sucessor, tamanha a confiança que tinha em dar a volta por cima, apostando na péssima administração que faria na Prefeitura de Ilhéus. O comentário era de que, para Jabes, seria a glória retornar ao Palácio Paranaguá nos braços do povo, literalmente.

Do outro lado, o Partido dos Trabalhadores (PT) pretendia “melar” os planos de Jabes Ribeiro, tirando o candidato Valderico Reis da campanha eleitoral, pela via judicial ou pela votação, elegendo o médico Rui Carvalho prefeito de Ilhéus. Alianças com os partidos de esquerda, principalmente com o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que teimou em indicar o candidato a vice-prefeito e disso não abria mão.

E o camarada Gustavo César (Gustavão) foi o escolhido para fazer a parceria com Dr. Rui na chapa como candidato a vice-prefeito. A indicação foi considerada uma tormenta, e o candidato petista não queria de forma alguma aceitar o parceiro de chapa. Chega a turma do deixa disso e argumenta a capacidade de aglutinação de Gustavão entre os outros partidos e simpatizantes de esquerda, lembrando que tinha sido questão fechada.

Mas nenhum dos argumentos convenciam Dr. Rui Carvalho, que não aceitava o companheiro de chapa, embora não chegasse a declinar o motivo de tanta rejeição ao camarada Gustavão. Foi aí, então, que os coordenadores da campanha exigiram que Rui Carvalho desse “nome aos bois”, ou melhor, contasse os motivos da recusa, pois até aquele momento ninguém sabia o porquê.

Já que vocês fazem questão de saber o motivo, pois voltem lá e peça aos comunistas outro candidato a vice na nossa chapa, para ganharmos a eleição sem qualquer tipo de dificuldade. Vejam bem, uma chapa dessas vai ser execrada pela sociedade, inclusive no marketing político. Imagine, nossa chapa vai ser chamada de “o belo e o fera” – disse, numa referência ao conto dos Irmãos Grimm.

Claro que o “belo” era o próprio Rui e o “fera” seu amigo, o comunista Gustavão.

Diante das perspectivas de uma grande vitória nas eleições, os coordenadores voltam ao comando dos “cururus” e, meios sem jeito, explicam a situação, contando a terminante recusa do Dr. Rui em aceitar o candidato a vice. De início, o motivo pareceu muito banal para uma tirar Gustavão da chapa, mas não restavam dúvidas que era preciso fazer mais um sacrifício para sairem vitoriosos na eleição.

Como o importante seria ganhar a eleição, os comunistas resolveram discutir o assunto, ouvindo a opinião dos camaradas. Pensa daqui, pensa dali e não conseguem encontrar um candidato com os atributos de estética (beleza) exigidos por Dr. Rui, até que se lembraram do “velho militante” comunista com domicílio eleitoral em Ilhéus e que poderia ter um forte apelo na sociedade. Mas guardaram o nome até a discussão.

Após mais de uma dezena de telefonemas e reuniões, finalmente os comunistas descobriram uma solução interna. É que eles lembraram do professor, escritor, jornalista e poeta Jorge Araujo (sem acento no u), como a saída para o impasse (era o nome escondido). Afinal, que defeitos o exigente candidato petista colocaria num intelectual acima de qualquer suspeita, e ainda por cima com obras literárias consagradas?

Mas como os traços físicos exteriores de Jorge Araujo não preenchiam os padrões imaginados pelos coordenadores de campanha como sendo os exigidos pelo Dr. Rui, fecharam questão e astuciaram toda a argumentação necessária. Lá chegando, ao dar o nome do candidato a candidato a vice, Dr. Rui franziu o cenho, e antes que sentenciasse a negativa, disseram:

Olhe, Dr. Rui, nós sabemos que Jorge Araujo não é nenhum modelo de encanto físico, mas que possui uma beleza interior isso ninguém pode negar – emendaram.

A chapa foi formada sem maiores constrangimentos, mas não conseguiu encantar o eleitor ilheense, que preferiu votar em Valderico Reis e Newton Lima. E olha que Valderico Reis nunca foi um modelo de beleza a desfilar nas passarelas. 


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

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Manuel Leal de OliveiraDaqui de Canavieiras, onde mantenho minha sossegada trincheira, antevejo um futuro incerto para os manguezais lavados pelos rios Pardo, Salsa e Patipe, Cipó e outro menos votados que formam esse imenso delta, berçário dessa colossal fauna marinha. Sem os crustáceos circulando na área, o mangue perderia seu grande conceito de berçário esplêndido dos rios e mares.

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Não estranho mais nenhuma invenção neste mundo corrido de hoje, em que as tecnologias passam mais rápidos do que os dias da semana, do mês, e em que o ano passado parece que foi ontem. Mas não discordo que tenha lá suas vantagens para sabermos o que está se passando. Se antes tínhamos que ir a uma biblioteca para consultar a Enciclopédia Delta-Larousse, hoje basta uma espiada no Google.

Depois dessa política de proteção aos animais ameaçados de extinção ou coisa que o valha, nossos campos estão mais verdes e nossos mangues mais povoados de caranguejos. Ainda bem, pois a história que vou contar me causou calafrios por simplesmente pensar que deixaria o velho hábito de comer meu caranguejo-uçá, quebrando as patinhas (puã) nos dentes.

É que eu soube que a designer sul-coreana Jeongwon Ji deslumbrou o mundo ao apresentar uma invenção inusitada: transformar caranguejos chineses em plásticos. Olhe que acredito piamente nas novas tecnologias, mas, aqui pra nós, tenho minhas dúvidas sobre a eficácia dessa transformação. Não entendo nada de química, e poucas são as informações que disponho para travar um debate sobre essa estranha invenção.

Mesmo assim, fosse o contrário, minhas dúvidas por certo seriam infundadas, haja vista parecer mais eficaz que transformemos produtos inorgânicos em orgânicos. Não é de agora que nos chegam aos ouvidos notícias alarmantes sobre a destruição do meio ambiente e fiquei deveras atordoado com a possibilidade de ter o caranguejo apenas nas boas lembranças do passado.

Ao que pude perceber após muita pesquisa, essa invenção dá a entender que este é um caminho aberto para alargar essa possibilidade invencionice. Imagino eu a corrida aos mangues para a captura desenfreada dos nossos caranguejos-uçás, guaiamuns, aratus e outros crustáceos nem tão abundantes em nossos manguezais, para transformá-los em brinquedos de plástico. Um verdadeiro absurdo.

Pelos meus nem tão precisos cálculos, nossos novos catadores promoveriam o extermínio desses crustáceos num piscar de olhos, antes mesmo qualquer reação do Ibama, Instituto Chico Mendes ou qualquer outra organização não-governamental recém-criada com a finalidade de coibir a caça desenfreada aos nossos saborosos artrópodes. Afinal, Deus deixou as coisas boas do mundo para seus filhos se deliciarem.

De logo, vou colocando minhas barbas de molho com receio das medidas governamentais que poderão ser tomadas para a criação da Caranguejobras, aparelhada por companheiros e coligados. Devido a importância do empreendimento, por certo também serão acomodadas algumas centenas de ambientalistas, de preferência caranguejólogos, dada a especialidade nos produtos do mangue.

Daqui de Canavieiras, onde mantenho minha sossegada trincheira, antevejo um futuro incerto para os manguezais lavados pelos rios Pardo, Salsa e Patipe, Cipó e outro menos votados que formam esse imenso delta, berçário dessa colossal fauna marinha. Sem os crustáceos circulando na área, o mangue perderia seu grande conceito de berçário esplêndido dos rios e mares.

Em terras canavieirenses o caranguejo é tão importante que é quem dá as boas-vindas aos turistas e visitantes mais amiúdes, numa cópia majestosa em fibra de vidro, sempre pronto para posar para fotos. Ao ler sobre a designer sul-coreana Jeongwon Ji fiquei com a pulga atrás da orelha e me lembrei de um atentado que o caranguejo sofreu em pleno Carnaval do Coronavírus e me pus a puxar o fio da meada para apurar responsabilidades.

Para minha tristeza, serei testemunha ocular do sumiço da gostosa “cabeça de robalo”, uma das iguarias mais famosas da gastronomia canavieirense. Se fosse só por isso me contentaria, mas ainda não somos conhecedores dos terríveis efeitos causados pelas devastações provocadas pela captura desenfreada do tão gostoso crustáceo.

Mas não pensem os senhores que estou advogando em causa própria com o egoismo tão peculiar dos viciados no primeiro dos sete pecados capitais: a gula, assim definida como tal pelo Papa Gregório Magno. Lembro aqui do grande número de famílias que laboram na enorme cadeia produtiva e que ficarão desprovidas do ganha pão. Ainda bem que os seiscentos reais ao auxílio aliviam, por enquanto, mas…

Brincadeiras à parte, como Deus ainda não me concedeu o dom de prever o futuro, não vislumbro qualquer possibilidade de vantagem nessa invenção, com todo o respeito que devemos aos orientais. De minha parte, guardo reservas até que minhas conjecturas se confirmem infundadas e possamos sentar à mesa em um bar nos fins de semana e pedir ao garçom meia dúzia de caranguejos grandes e gordos, acompanhado de uma cerveja bem gelada.

Mas caso a invenção seja verdade, no mínimo, decretaremos o fim do mundo. 


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

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Valderico Reis

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A campanha eleitoral de Ilhéus corria a solta em 2004, com as candidaturas de Valderico Reis, Soane Nazaré de Andrade, Ruy Carvalho, Ângela Sousa, Roland Lavigne, Correia e Magno Lavigne à prefeitura ilheense. Com base eleitoral mais privilegiada junto aos bairros carentes, onde costumava frequentar bares e botecos famosos pela cerveja gelada e comida pesada (sarapatel, mocotó, dentre outras iguarias), Valderico Reis se sentia nas nuvens e não admitia perder da campanha.

Além de ser bem recebido nesses locais, nos quais era frequentador assíduo – ao contrário dos outros candidatos –, se sentia em casa e era tratado pelos moradores como um membro da família. Bebia cerveja, pagava cachaça para todo mundo, e provava de verdadeiros banquetes durante as caminhadas e nos comícios esses bairros viviam uma verdadeira apoteose.

Valderico Reis era empresário do setor de transportes urbanos e interestaduais e se tornou inimigo figadal do prefeito Jabes Ribeiro, por motivos que aqui não merece uma avaliação mais abalizada. E foram justamente as discussões entre os dois que fizeram Valderico lançar sua candidatura a prefeito, com a finalidade de derrotar o candidato apoiado pelo prefeito Jabes Ribeiro.

Mas para Valderico isso só não bastava, era preciso falar mal de seu inimigo – o prefeito Jabes Ribeiro – e garantir o voto com as promessas de campanha, que jurava ser o primeiro prefeito a cumpri-las, na íntegra, pois era um empresário de sucesso. No discurso, se apresentava como o único candidato que não precisava do dinheiro da Prefeitura, e todo o salário (subsídio) recebido seria doado para a construção de creches, escolas e instituições sociais.

E quando falava que era um empresário de sucesso e não dependia do dinheiro da prefeitura, os eleitores iam ao delírio. Finalmente Ilhéus teria um prefeito que governaria com o povo. E a cada caminhada pelos bairros periféricos e morros Valderico desfiava seu corolário de realizações, que daqui pra frente beneficiaria, sobretudo os mais pobres, gente simples, assim como ele, que falava a língua do povo.

A educação seria tratada como nunca e não ficaria um só aluno fora da sala de aula, recebendo merenda de qualidade e ensino durante todo o dia, com matérias profissionalizantes, para que o jovem aprendesse uma ocupação de verdade. A partir do início do seu governo construiria creches para que os pais pudessem trabalhar o dia inteiro, enquanto os filhos ficariam sob os cuidados da prefeitura.

E as camadas mais pobres da população poderiam ter certeza que Valderico Reis iria a Brasília buscar recursos para construir casas populares, livrando-os dos pesados alugueis. Para isso já teria conversado com deputados e senadores para tirar Ilhéus do atraso, das ruas esburacadas e cheia de lama. Até o final do seu mandato Ilhéus inteira teria asfalto de primeira em todas as ruas.

A saúde era outro segmento que Valderico Reis prometia privilegiar, pois sabia dar valor, por ter origem humilde. Num desses comícios, mais exatamente no bairro Nossa Senhora das Vitórias, iniciou falando do descaso do governo municipal com os moradores, relegados ao abandono, mostrando que não existia esgoto no local, o lixo não era recolhido e nem posto de saúde existia.

Por si só, o bairro carecia de tudo que Valderico prometia fazer para o bem-estar da população. A cada promessa, gritos de apoiado, salva de palmas, o povo entrava em delírio. Não restavam dúvidas que era o candidato ideal para governar Ilhéus. Lá pras tantas, empolgado com a atenção dos moradores, ao ver umas senhoras de idade, resolveu fazer ampliar as promessas, e disse:

– Quando eu for prefeito vou implantar cirurgia plástica nos postos de saúde e todas as mulheres vão ter direito a ficar com os peitos durinhos – exclamou.

E para demonstrar que estava falando a verdade, pegou nos seios de uma mocinha que estava ao seu lado e se saiu com mais essa:

– Não estou mentido não, todas vocês vão ficar como essa menina aqui, ó! – e continuou com o discurso, embora não tirasse a mão do corpo da mocinha, para delírio da plateia.

No fundo do palanque os marqueteiros Valdomiro Júnior e Vander Prata comemoravam a vitória da campanha. Não deu outra, Valderico Reis ganhou a eleição disparado. Quanto às promessas…deixa pra depois…


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

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O Itabunense gosta de trabalhar, da boa música e do bom futebol // Foto de Pedro Augusto

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Nesta quarta-feira – 28 de julho – Itabuna completa 111 anos de emancipação político-administrativa e, mesmo maltratada que foi durante esse período de pandemia, comemora. Mas quem irá contrariá-la? Para uma cidade cosmopolita como Itabuna pouco importa a dificuldade sofrida, as intervenções desastrosas que tentaram frear o seu costumeiro desenvolvimento. Sabe superá-las.

Itabuna nasceu para brilhar! Se atualmente não nos mostra mais o espetáculo feérico com suas luzes de neon e acrílico nas fachadas das lojas da avenida do Cinquentenário, é porque se tornou mais discreta com o passar dos anos. Saudosistas – como eu – por certo gostariam de ver suas vitrines decoradas com a moda mais recente, exibindo com orgulho as cores de sua bandeira na ornamentação.

Isso deve ser coisa do passado! Ou não. Quem sabe ainda se recupera dos meses de fechamento, medidas tomadas para conter o temível vírus que ceifou muitas vidas nessa sua passagem desenfreada. Não é a primeira vez que Itabuna sofre um revés dessa magnitude e se recupera seguindo fielmente aquela letra do samba de Paulo Vanzolini: “Levanta sacode a poeira e dá a volta por cima”.

Se voltarmos um pouco na história, Itabuna – ainda distrito de Ilhéus – já possuía sua Associação Comercial, instituição atuante e que lutou bravamente para a transformação da vila em cidade, luta finalmente vitoriosa em 1910. Fundada em 1908, a Associação Comercial nasceu pioneira no Sul da Bahia e sua coirmã de Ilhéus foi criada apenas quatro anos depois – em novembro de 1912.

No comércio, o pioneirismo tomou o mesmo caminho pioneiro com o Clube de Diretores Lojistas – posteriormente Câmara de Dirigentes Lojistas – entidade fundada em 1963, seguindo o exemplo do Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador. A entidade não se restringiu às promoções em datas importantes como Natal, Dia da Cidade, Dia das Mães, Dia dos Pais e inovou com os concursos de vitrines em todas as datas comemorativas.

As grandes lojas nacionais abriam suas filiais em Itabuna e se notabilizavam pelo volume de vendas e cada espaço da avenida do Cinquentenário era disputado pelas tradicionais redes varejistas, que “brigavam” em pé de igualdade com as lojas locais. Os lançamentos das badaladas grifes eram realizadas simultaneamente com as grandes capitais brasileiras. Os long plays nacionais e internacionais tocavam em nossas três emissoras de rádio no mesmo dia em que estreavam em Rio e São Paulo.

Não sei se o itabunense era e ainda o é exibido, mas dançava nos clubes e boates ao som de bandas de sucesso e cantores contratados a peso de ouro, mesmo tendo à disposição músicos de primeira qualidade na banda Lord (show, ritmos e hoje Lordão). Chegavam aos clubes em carrões do tipo Aero Willys, Simca Chambord, Esplanadas, Galaxy e LTD Laudau, Opalas, vendidos pelas concessionárias que ganhavam prêmios como campeões de venda em todo o Brasil.

Era a época de ouro do cacau, das enormes fazendas de gado, de nossas casas bancárias e bancos comerciais locais, que movimentavam a economia regional junto com as grandes exportadoras de cacau, todas sediadas em Itabuna. É verdade que sofremos bastante com a chegada da vassoura de bruxa, mas lembramos da expertise anterior de ultrapassar as barreiras com outras doenças que atacavam o cacau, inclusive a pior delas, a oscilação de preço comandada pelo mercado internacional.

O Itabunense gosta de trabalhar, da boa música e do bom futebol. Não esconde que passou alguns anos longe do sucesso nos gramados, e, aos poucos, ensaia o retorno. E não poderia ser diferente, até para homenagear os craques de nossa seleção amadora hexacampeã, bem como os atletas do Rio Banco, de Itabuna, que em 1920, ao marcar o primeiro gol contra o Ypiranga, de Ilhéus, em jogo não terminou. Os ilheenses declararam guerra e sequestraram até o “trem de ferro” que logo retornaria a Itabuna.

O Itabunense não se abate e muitas vezes reclama com altivez dos que maltratam a sua cidade, levando-os ao ostracismo político com a mesma intensidade que os distinguiu e os elegeu. E segue a vida. É justamente esse comportamento que faz com que a cidade consiga superar grande parte das dificuldades, transformando-as em pautas de interesse econômico e social, por meio da geração de emprego e renda.

E como lembrar é preciso, na última década do século passado (nem tão distante) a economia de Itabuna despencou, fruto da colaboração do poder público municipal, chegando a fechar quase todas concessionárias de veículos. Cinco anos depois, todas elas estavam de volta e realizando bons negócios, numa demonstração de sua vocação natural para o comércio, indústria e os serviços.

Itabuna é a cidade do primeiro shopping center, do grande polo da educação, do centro de excelência da saúde, do comércio e serviços automotivos, das indústrias, dos serviços econômicos, administrativos e contábeis e do direito. Como num passe de mágica, as dificuldades da pandemia fez surgir a indústria e comércio informal de alimentação, com todas as vantagens e conforto do delivery, sem que alguém tivesse qualquer formação ou treinamento formal.

É Itabuna o maior palco para os artistas da música, que se apresentam com frequência nas centenas de barzinhos noturnos espalhados no centro e nos diversos bairros. É Itabuna o point dos botecos especializados, onde o cliente tem cadeira cativa; das cervejas artesanais de qualidade, produzidas pelos amigos ou conhecidos do dia a dia, gente nossa que faz acontecer sem firulas.

É a mais cosmopolita das cidades baianas. E não poderia ser diferente por ser uma cidade para onde convergiram pessoas de todas as nações, etnias e religiões, na mais perfeita harmonia. O judeu é o maior amigo do árabe; o negro, o branco e o amarelo são simples cores de uma paleta ou aquarela para que os artistas expressem seus sentimentos. Existem os dissonantes, paciência, estes também fazem parte da natureza humana.


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

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Brasília, onde se resolve tudo no jeitinho

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Casuísmos não faltam à administração pública no Brasil. E não é coisa de agora, já nasceu colocando um absurdo no registro de nascimento: a famosa carta enviada pelo escrivão Pero Vaz de Caminha ao Rei Dom Manuel, em que pedia benesses para seus familiares por participar do descobrimento deste Brasil varonil. Embora eu pessoalmente não tenha ciência do resultado, acredito que o pleito tenha sido deferido, pois era costume à época.

Naquele tempo, tudo podia desde que o rei, Sua Majestade, concedesse os benefícios reais a qualquer dos súditos, por relevantes serviços prestados ao Reino ou mesmo à Coroa. Afinal, como dizia o Rei Luiz XIV, o brilhante Rei Sol, “L’État c’est moi”, ou “o Estado sou eu”, pois exercia o poder absoluto sobre o reino da França por 72 longos anos de deslumbramento.

Mas vamos nos ater no Brasil, que copiou ou transferiu os costumes reinantes da Corte de Portugal, mesmo antes de Dom João VI desembarcar em Salvador e no Rio de Janeiro, distribuindo concessões por onde passasse e a quem lhe pedisse. Além dos benefícios financeiros, com sinecuras tantas, ainda existiam os títulos de nobreza dados desde aos mordomos e outros cuidadores reais, até aos ricos bajuladores do poder.

Com a proclamação da República, pensavam alguns que os usos e costumes mudariam, conforme a etimologia do nome res publica, coisa de todos, do povo, o que acabou não acontecendo, na realidade. República instalada, tinham os que queriam a república ditatorial, que foram defenestrados, e os que preferiam a república democrática, engrossados pelos que apoiavam a monarquia e que não queriam perder as benesses.

Nos costumes de hoje, aquela turma de antes levava a sua mesada – e olhe que ainda não tínhamos criado o mensalão – para emprestar o apoio ao governante de plantão, já sob o argumento da governabilidade. E assim passaram os anos e governos nas esferas federal, estadual e municipal, diferenciando-os apenas no índice de poder e de concessões aos amigos e colaboradores.

Sem qualquer constrangimento, muda-se de partido como quem muda de camisa, com a explicação na ponta da língua, desde que a reciprocidade seja entregue por meios diversos, desde em cédulas em vigor no Brasil ou em países estrangeiros. Podiam, e ainda podem, ser esses pagamentos feitos na base do escambo: voto no seu interesse e recebo favor nos mesmos moldes.

Daí é que acredito tenha sido criada a emenda parlamentar, na qual o beneficiado não é o popular, alguém do povo, mas o próprio político, com uma obra que, coincidentemente, passe pela porteira de sua fazenda, o asfaltamento da rua onde more. Fatos apontam, também, para a informação privilegiada de determinada vultosa obra, onde quem compartilha o segredo passa a comprar léguas e mais léguas de terra.

Como nos mostrou o mensalão e o petrolão, outros meios mais sofisticados foram criados para esconder dos fuxiqueiros, a exemplo do apoio de terceiros, com as riquíssimas colaborações nas campanhas eleitorais. Eu beneficio você, que também me beneficia, pois já recebeu o benefício dado de forma bastante desinteressada do meu amigo e que passa a ser seu amigo.

Assim ficou tudo mais fácil, pois as leis passaram a ser feitas de acordo com os interesses de nosso grupo, beneficiando aqueles que compartilham não só nossas ideias e redes sociais, mas a nossa esperteza. E tudo se resolve entre quatro paredes, como a rodovia litorânea que de repente cisma em se desviar para o interior, sob qualquer desculpa técnica que mereça ser dada.

Há outro jeitinho nas leis para os que gostam de enveredar por caminhos mais fáceis e que alguns chamam de tortuosos, com a singela finalidade de escapar das garras da lei, não importando de que lado possa estar. Se já tivemos a chamada Lei Fleury, nada nos impede que possamos ter a lei que quisermos. Ora, o congresso sempre dá um jeitinho para aprovar a reeleição de uns e cassar a de outros, como quer FHC.

Os fins justificam os meios, não podemos é deixar de honrar os pedidos de nossos amigos mais chegados. Ora, casuísmo é apenas a submissão de um pensamento e o apoio a um chegado. Como se diz: O amigo tem de ser amigo do amigo, do contrário, não é amigo do amigo. E o que o brasileiro mais preza é ser amigos dos amigos! E olha que a res publica deveria ser de todos…


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

*A análise do colunista não reflete, necessariamente, a opinião de Pauta.blog.br

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Manuel Leal de Oliveira

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Manuel Leal de Oliveira foi uma figura ímpar do Sul da Bahia. Eclético e desinibido, sempre esteve presente nas mais diversas ocasiões relevantes da política e da economia regional. Morou um tempo na Guanabara e São Paulo. Na capital carioca, trabalhou nos jornais Última Hora e Jornal do Commércio. Após tirar a “sorte grande” na Loteria Federal, volta a Itabuna.

Já em terras grapiúna, Manuel Leal adquire, com os recursos da premiação, uma fazenda em Firmino Alves (ex-Itamirim), onde por muito tempo ocupou cargos e a presidência do Sindicato Rural. Como sindicalista patronal rural, demonstrou prestígio e fez parte da diretoria do outrora Conselho Consultivo dos Produtores de Cacau-CCPC), chegando a ocupar cargos importantes, como a Secretaria.

Foi sócio de alguns empreendimentos, entre eles uma fábrica de balas e uma indústria de química que fabricava água sanitária e alvejante: a Alvex. Usando sua experiência adquirida na área de marketing dos jornais do Rio de Janeiro, promoveu uma revolução na comunicação de Itabuna, junto com o jornalista Cristóvão Colombo Crispim de Carvalho, ao promover o lançamento do produto utilizando o teaser.

Manuel Leal possuía verve afiada e uma facilidade incrível de fazer amigos – desafetos também –, tornando uma pessoa importante na sociedade regional. Foi fiscal da Prefeitura de Itabuna e, em seguida, nomeado fiscal do Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Comerciários (IAPC), que mais tarde se tornou o Instituto Nacional de Previdência Social (INSS), após a unificação do sistema.

Vida estabilizada – cacauicultor, empresário, funcionário público –, Manuel Leal sempre teve uma grande paixão: o jornalismo. Ainda estudante do Colégio Divina Providência, fundou o polêmico jornal A Terra, que lhe tornou ainda mais conhecido. Logo depois criou o Tribunal Regional, que fizeram história ao falar abertamente do cotidiano, da economia e da política, sempre com uma linguagem afiada, o que não agradava os poderosos.

Desde estudante que era considerado comunista, embora se relacionasse perfeitamente e com destaque com pessoas das mais diversas classes sociais e ideologias, seus amigos e de sua família. De vez em quando um comunista famoso procurado pela polícia era abrigado em sua casa ou fazenda, com todas as honras e mesuras que merecia, a pedido dos tantos amigos.

Em 1987, junto com o escritor e jornalista Hélio Pólvora, Manuel Leal funda os jornais Cacau Letras e A Região, dois jornais elaborados com esmero e que – de cara – ocuparam o merecido lugar na comunicação estadual. E A Região conseguiu chegar ao clímax, influenciando o pensamento e a política regional. E o jornal passou a ser aguardado aos sábados pelo conteúdo altamente polêmico.

Além de Hélio Pólvora, passaram pelo A Região editores e repórteres da mais alta linhagem do jornalismo sulbaiano, mantendo, sempre, o tom “manuelino” que fez história na comunicação regional. Algumas semanas a tiragem de 5 mil exemplares era insuficiente para atender aos ávidos leitores e a gráfica tinha que se desdobrar para aumentar o número de exemplares.

Lembro-me quando editor de A Região – junto com Daniel Thame – inovar na diagramação do jornal, modificando, inclusive, a primeira página para aproveitar uma grande notícia de última hora. Não raro, jornal na gráfica, nos livrávamos das chamadas da primeira página, substituindo-a por um tijolão de três laudas e uma foto de um fato que não poderia deixar de ser publicado.

Com todas essas atividades, Manuel Leal nunca deixou de ser o fiscal do INSS, fiscalizando empresas das cidades baianas. Numa dessas viagens tinha como motorista o seu fiel escudeiro José Emanoel Aquino, o conhecido “Cambão”. Ao se aproximar do posto da Polícia Rodoviária Federal, em Itamaraju, o policial fez o sinal para o veículo em que viajavam parar para fiscalização.

Assim que o policial se aproximava do carro, Manuel Leal sacou do bolso da camisa uma carteira de couro com as armas da República contendo sua carteira funcional do INSS, e brandiu:

– Fiscal federal do INSS. Estou a serviço! – exclamou.

Tranquilo, o policial rodoviário não se intimidou com a carteirada e retrucou em quente:

– E o senhor quer dizer que eu estou aqui brincando, não é…Favor passar os documentos do veículo e do condutor – pediu.

Como não estava acostumado a ser retrucado com veemência, Manuel continuou a viagem até Medeiros Neto sem dar uma palavra com seu amigo “Cambão”.

Manuel Leal foi assassinado após uma denúncia feita pelo jornal A Região. Hoje o jornal é mantido na forma digital pelo seu filho, o jornalista Marcel Leal. 


Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado

*A análise do colunista não reflete, necessariamente, a opinião de Pauta.blog.br

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Avenida Soares Lopes, em Ilhéus

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Confesso que me inspirei em crônica do Zé Nazal publicada recentemente no blog do Walmir Rosário sobre o “narrador Dalton Gomes”. O empresário e radialista Paulo Kruschewsky realmente tinha cada uma…

De uma certa feita Paulo Kruschewsky combinou com Jorge Caetano e Seara Costa, seus dedicados repórteres, que “sumiriam” dentro da radio e transmitiriam o clássico entre as seleções de Ilhéus e Vitória da Conquista, diretamente da terra do frio, pela Rádio Sociedade da Bahia. “Apareceriam” somente na segunda feira. Assim combinado. Assim feito.

Entretanto, eles não contavam com o famoso imponderável da época nas transmissões pelo rádio.

Aos 35 minutos do primeiro tempo ocorre um pênalti a favor dos ilheenses. Vai para a cobrança o jogador Deco… e “puf” a Radio Sociedade sai do ar… Paulo olha para Seara e este para Caetano… e o Kruschewsky diz: “O Deco não é de perder pênalti. Vou gritar gol…”

Imaginem o suplício de Paulo Kruschewsky e da equipe até a Sociedade voltar ao ar aos 15 minutos do segundo tempo. E o locutor dizia: “O tempo e o placar na terra do frio: Ilhéus 1, gol de Deco cobrando pênalti aos 35 do primeiro tempo; Vitória da Conquista 0.” E o Paulo exclamou: “Eu não disse… Eu não disse…”

E para a alegria de Paulo Kruschewsky e de sua equipe o jogo terminou 1 a 0. Era tanta a alegria que Paulo nem ligou para que Conquista ficava 250 quilômetros distante e meia hora depois foi comemorar com os torcedores ali mesmo com os ilheenses na avenida Soares Lopes…


Ramiro Aquino é jornalista, radialista e cerimonialista.

*A análise do colunista não reflete, necessariamente, a opinião de Pauta.blog.br

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A CEPLAC foi implantada em 1962

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Já não se desenha mais a absorção da CEPLAC pela EMBRAPA. Com a nomeação de um Diretor geral que conhece cacau por ouvir falar e, agora, uma coordenadora de pesquisa com mesmo pedigree, as cores foram fixadas.

E como a região esqueceu do que fora a sua instituição, deve estar eufórica e crendo que doravante a cacauicultura será outra.

Há uns 5 anos atrás alertei para certos detalhes, quando se falava nesta hipótese, como a salvação da lavoura. É de bom alvitre reforçar ainda mais a diferença entre as duas Instituições, que são díspares.

A EMBRAPA possui diversos Centros de produtos, tais como soja, fruticultura e mandioca, arroz e feijão, dentre outros. E adicionalmente, Centros de Recursos como o dos Cerrados, do Semiárido.

O CEPEC (Centro de Pesquisas do Cacau), implantado pela CEPLAC em 1962, com uma outra concepção, abrangendo tanto os produtos como os recursos, haja vista as pesquisas e levantamentos tanto nas disciplinas agronômicas (genética, solos, fitopatologia, fisiologia vegetal, entomologia, engenharia da produção, tecnologia de alimentos) quanto referentes aos recursos naturais (Pedologia, botânica, climatologia, fitogeografia, fotogrametria).

Dessa forma, o CEPEC, além das tecnologias de produtos, executava detalhados trabalhos fitogeográficos, pedológicos e climáticos, além dos acervos importantes como o herbário, os arboretos; de ações ecológicas na Estação Pau-Brasil, em Porto Seguro, bem como a instalação de um fundamental campo de germoplasma, em Belém; ou seja, era um centro sistêmico que não segmentava o problema por disciplina ou produto.

Tudo estava numa mesma unidade de pesquisa, possibilitando uma melhor aplicação das tecnologias geradas, bem como facilitando análise e interpretações com vistas a novas ações de desenvolvimento rural integrado.

Por outro lado, trabalhar com cultivos perenes não é a mesma coisa do que lidar com culturas de ciclo curto. A EMBRAPA nos mostrou isso. Muito bem, nestes, mas sendo muito insuficiente naqueles. Uma simples comparação, evidencia ainda mais, se a gente visualiza a Amazônia.

Lá está a pujança do cacau. Quem implantou? Talvez esteja equivocado, mas na mesma magnitude, desconheço a ação da EMBRAPA em outras lavouras perenes.
Não preciso dizer mais nada. Um bom entendedor há de se reflexionar e, quem sabe, dar razão a um pioneiro; neste 2021 completando 58 anos (janeiro de 1963) quando tive minha carteira profissional assinada. (Maceió, 26/06/2021) 


Luiz Ferreira da Silva é pesquisador aposentado, ex-diretor da CEPLAC/CEPEC

*A análise do colunista não reflete, necessariamente, a opinião de Pauta.blog.br

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